Projeto Ilustra (maio)

Olá! Último dia do mês é dia de mostrar o resultado do Projeto Ilustra!

O tema desse mês era: flores. Assim como o tema do mês passado, gostei muito da escolha deste mês.

Pensando a respeito do que desenhar, lembrei do livro A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade, em especial do poema A flor e a náusea. Tenho meus problemas com alguns poetas, mas esse não é o caso do Drummond, dele eu gosto muito e recomendo para todos que não têm paciência para os jogos de palavras vazios que representam grande parte da poesia por aí.

Confesso que eu tinha escrito alguns parágrafos explicando meu desenho, o que eu pretendia com o traço, com as cores, com a composição em si… mas apaguei tudo e resolvi fazer diferente. Achei que aqueles parágrafos estavam delimitando a leitura do desenho e especialmente do poema. Por isso, deixo apenas o poema de Drummond e meu desenho abaixo para que cada um possa pensar e sentir por si mesmo e deixar nos comentários a sua leitura, seja do poema, do desenho ou dos dois. Quanto mais leituras, mais rica será a experiência!

A flor e a náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas,

vou de branco pela rua cinzenta.

Melancolias, mercadorias espreitam-me.

Devo seguir até o enjoo?

Posso, sem armas, revoltar-me?

 

Olhos sujos no relógio da torre:

Não, o tempo não chegou de completa justiça.

O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.

O tempo pobre, o poeta pobre

fundem-se no mesmo impasse.

 

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.

Sob a pele das palavras há cifras e códigos.

O sol consola os doentes e não os renova.

As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

 

Vomitar esse tédio sobre a cidade.

Quarenta anos e nenhum problema

resolvido, sequer colocado.

Nenhuma carta escrita nem recebida.

Todos os homens voltam para casa.

Estão menos livres mas levam jornais

e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

 

Crimes da terra, como perdoá-los?

Tomei parte em muitos, outros escondi.

Alguns achei belos, foram publicados.

Crimes suaves, que ajudam a viver.

Ração diária de erro, distribuída em casa.

Os ferozes padeiros do mal.

Os ferozes leiteiros do mal.

 

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.

Ao menino de 1918 chamavam anarquista.

Porém meu ódio é o melhor de mim.

Com ele me salvo

e dou a poucos uma esperança mínima.

 

Uma flor nasceu na rua!

Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.

Uma flor ainda desbotada

ilude a polícia, rompe o asfalto.

Façam completo silêncio, paralisem os negócios,

garanto que uma flor nasceu.

 

Sua cor não se percebe.

Suas pétalas não se abrem.

Seu nome não está nos livros.

É feia. Mas é realmente uma flor.

 

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde

e lentamente passo a mão nessa forma insegura.

Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.

Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.

É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

 

a flor e a náusea - grafite 6B.jpg

E para quem ficou curioso quanto aos materiais, usei papel Canson 90g/m² em tamanho A5, lápis grafite 2B (da Faber-Castell) e 6B (da Koh-I-Noor) e os lápis de cor Prismacolor e Polychromos  (da Faber-Castell).

 

***

Fiz também outro desenho para o projeto nesse mês (já que o limite é de cinco), esse bem colorido e com mais flores.

Coração com Girassois - aquarela.jpg

Para esse eu usei papel Canson 300g/m² tamanho A4, aquarela em pastilhas e lápis aquareláveis Koh-I-Noor. Tudo feito, é claro, sob a supervisão da Aurora.

CAM01214.jpg

Espero que tenha gostado e não esqueça de comentar 🙂

 

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Até mais,

Nani